Cronicália

Era límpida manhã no trópico
Mariasfedidas acasalavam sobre casco de pitangueiras
O suor pórtico da glória musical abençoara os despertos
A imaginação ingênua genuína aprisionava o poeta travesti
A argamassa do presente social pulsava em fétida e alegre criolina
E um poucado engravatado sem rosto nem nome dava as ordens ao maquinário pesado.

Sem opções
Inútil dispensável
João carregava formigas mutantes em suas veias
População que tirava-lhe proveito
Em troca de obediência
Até que certo dia
João pediu aos insetos por paz mundial
E noventenove centézimos da população humana
Foram devorados por libélulas e lagartixas ensandecidas.

Criança em cruzada astral
Nascera com quatro braços coordenados
Aprendeu a voar livre
Latejava amor infinitesimal trapézio adentro
Esquadro monumental
Rota das índias infalível
Sagrado ohm silente
Os trinta dedos tensionaram
Em vôo solo à citara
Espargiu-se em luz invisível
Depois tornou em cera e seda.

O médico doutor tossia asco
O estudo corrompera-o
Fizera-o sádico irrazôneo
Estresse funesto o messias trocara as linhas
O grande experto em anatomias
Tomou gosto cruel perverso
Envenenava dolorosamente seus pacientes
Com receitas que jamais seriam decifradas.

O que mergulhou de crânio em rocha
De oito metros acima
Não morreu mas esqueceu
Esqueceu segredos vitórias e lamentos
Amnésia violenta que o libertara
Diz que só fazia o bem depois do incidente
Tomara o blecaute por dádiva
Decidira dar-se uma chance
De ser quem sonhava ser.

Milagre da dona de casa mestiça
Negra desprezada de nossa terra
Dando-se à prole fazendo fé
Pondo lenha ao fogo da água
Paridora
Que nunca terá um retrato publicado nos jornais
Nem no dia de sua morte
Inválida
Mãe feroz do futuro valente
E empregadinha honrada
Cabisbaixa à patroa patrícia
De bocetinha azedinha marcomida
Desleixo burguês ordenando a gentalha
Mundo injusto se dizia
Primeiras revoltas.

A hora da estrela do circense
Pobre jovem confusão
Lançara-se sem aviso ao abismo
Sonhara planar
Mas trocara sentir por saber
E a mente mentiu
A casa caiu o circo faliu
Quis que a ânsia fosse pronúncia
E se perdeu na denúncia
Deixou o prazer por amor
Fez rinha por carinho
Beijinho pra resolver a dor
Que antes de casar sara.

Nenhum comentário:

ESTÓRICO