Do Mote Gracioso

Há um magnetismo
natural
entre tudo que é belo

uma atração
fatal
entre olhares que brilham,

Há um magnetismo natural
entre as cútis que cantam

entre a boca faminta
e as tetas cheias de leite

entre o punho cerrado
e as paredes da miséria,

uma atração fatal
entre o peixe e o anzol

entre o breu da fechadura
e a luz libertina da chave

entre o coração valente
e os enigmas do horizonte...

Há um magnetismo
mágico
entre tudo que é sonho

uma atração
astral
entre mãos que dançam.

Como entre abelha e flor
entre musa atada e raptor

Como entre faca e queijo
entre sopro criador e beijo

Como entre a lua e o mar
que pelas ondas a tenta tocar...

Como entre música e atenção
entre objeto infinito e denominação

Como entre chuva e chão
entre pés ardentes e inspiração

Como entre a morte e a vida
que pelo destino não nos deixam saída...

Há um magnetismo natural
uma atração fatal
entre tudo que há de sublime.

Zás

Tudo
Tudo são momentos.

Nada mais que isso.

Efêmeros.

Zás!
Eletrizantes!

Conectantes

Esfrunzirantes!

Transpectantes
Profundamente simples...

Excomensurantes
Desvirgilantes

Transmutantes.

Ah que bom é ser aquele
cuja paz é contagiante.

Quero ver quem é
que vai me impedir

de fazer tudo do meu jeito
assassinar o tédio pelo amor!

Quem é que vai
me negar o suplício

a confissão
o desgosto amargo

quem é que vai
me empurrar longe

saber beber-me
poder sentir o radiante!

Zás!

Ad Eternum

Quando um dia
te perguntarem,
sobre tua vida:

Farias tudo de novo?

...se farias
tudo de novo...?

-fique sabendo,
é uma pergunta retórica-

Farás!
Farás tudo de novo!
Uma e outra e infinitas vezes!

Nó D'Goela

Queria fazer
da minha vida
uma homenagem aos amigos

uma homenagem
aos antigos amigos
aos novos e aos que nunca verei...

Queria fazer
dos meus dias
uma consagração

um agradecimento
profundo, sério, leve
uma prece com asas de borboleta!

Queria fazer
dos meus dias
grãos de areia

na ampulheta maior
do oceano de coragem
que o sol agita em sua luz...

Ah mas por este sorriso
quanto dei!

quanto destruí
quanto sofri!

Ah por este sorriso
úmido e misterioso

rapace
impiedoso

ah por este sorriso
quantos oceanos
a nado atravessei

quantos desertos
de frio e melancolia
em meu seio carreguei...

Ai solidão
do filósofo
do excepcional

te glozo -
glozemo-nos,
sou teu como és minha!

Tempestades sonoras
rebentam em torno de mim

não há permissão ao silêncio,
preciso do tempo amplo em que se fala...

Quisera fazer
dos meus sonhos
a fábrica de novas realidades

tirar amarula da pedra
encobertar refugiados políticos
dar horizonte de fascínio ao que aflora...

Quisera fazer
das minhas lágrimas
-das que rolaram e das que não-

da dor que não acode
do êxtase extremo que me sorve,
fazer de tudo minha unha e minha carne...

Quisera fazer
deste sorriso
ah este sorriso patético

uma escola
mundana
transmutante,

ah este sorriso
quisera fazer dele
o valor de minha existência!

Estiquepuxas

Não deu pra ir na festa,
melhor foi cuidar da minha coluna.

Já não sou mais
aquele adolescente indestrutível

já não sou mais
aquele jovem de joelhos de aço

que pulava com tudo pro alto
e socava potente o um do compasso

que sambava com todas as juntas
e caía no chão intacto quando quisesse...

Já não sou mais
aquele jovem invulnerável

já não sou mais
aquele bicho que crescia pra todos os lados

que ficava em pé sobre a moleira
que andava plantando bananeira

que dava nas urticárias coceira
que flutuava sobre toda asneira...

Quem sabe um dia
quem sabe

quem sabe um dia
eu volte a sê-lo...

Quem sabe
quem sabe um dia

eu possa de novo
dançar

dançar como se fosse
um adolescente indestrutível

de joelhos de aço
e pulmões sem fim

dançar como se fosse
aquele jovem inteiriço

de olhos livres de tersol
e ciático irretocável de poder...

Já não sou mais aquele,
mas

quem sabe,
quem sabe um dia...

Interincidências

Todo dia
é dia de continuar tentando.

Todo dia
é dia de acordar sonhando.

Todo dia
é dia de seguir lutando.

Todo dia
é dia de ir cantando.

Das Normas Salutares

Quem respeita
pode nem sempre ser respeitado,
mas só quem respeita
recebe um dia respeito.

Quem dá
pode nem sempre receber,
mas só quem dá
recebe um dia algo.

Quem ajuda
pode nem sempre ser ajudado,
mas só quem ajuda
pode um dia ser resgatado.

Quem ama
pode nem sempre ser amado,
mas só quem ama
recebe um dia algum amor.

Quem agradece
pode nem sempre ser reconhecido,
mas só quem agradece
pode um dia ser retribuído.

Quem fala
pode nem sempre ser ouvido,
mas só quem fala
- do coração -
pode um dia ser bem recebido.

Extafa

Por que será?

Será porquê
que toda vez
que piso na Bahia,
eu quero começar
a escrever um livro novo?

Será que é
por esse ar,
tão doce e fragrante?,
esse ar
que entra macio
e cheio de cor,

aos poucos
dando novos ímpetos
e redesenhando
pelos prazeres
da pele
a face sensível
do espírito...

esse ar,
frágil
sob a ensolação
que nos dias de sorte
se amaina
sob os nuvenzais
algodoados de cura,

esse ar
que é só o primeiro parágrafo
dum livro que quem sabe um dia exista.

Ou será
pela arte?

Mambembe,
embrenhosa
de titãs
meio caboclos
meio apolíneos,

de amizades
de dedos grossos
e mãos calejadas,
de amizades de bioconstruções
e meditações ativas divertidas das melhores lisergias...

Será por esta escola viva de arte
que a voz rouca da caneta de repente
vocifera, clamando por virgem caderno?

O papel reciclado
é agora ventre desnumerado
da mesma herança de arte sambante
que ama
- mais que tudo - atar e desatar
todas as qualidades dos nós escoteiros e velejadores,

surfe na veia
que nos salva
das resenhas prolixas
que criticam a literatura hang loose

já que jamais souberam
fazer da areia
farofa de sorvete,

segurar
todas as pontas
pra prevenir abstinências.

As serras
seguem
serrando,

marretas
a marrer,

braços
a torcer

e as linhas
a acabar

- e pro livro
não ficar às moscas,
fica assim,
um livro de uma página só.

Castoreios

Muitos momentos...

tantos
e tão ferozes
em sua transitoriedade.

Muitos momentos...

tantos e tão sutis
em sua velocidade imaginária
tão abundantes de beleza nua.

Há tanto a se dizer,
tanto a ser dito...

Tenho de dizê-lo de vez,
quero que disso algo fique...

Muitos momentos...

tantos
e é preciso adicionar-lhes
tempero entrementes...

Impersona

Gentilmente, ela se move
A melodia canta e dança em mim...

Areias destemporais, correm
na ampulheta rubra do meu coração...

Eu sou nós
eu sempre fomos nós...

Eu somos todas populações em mim
em constante administração
divisão de tarefas
diplomacias inter órgãos
meu itamaraty molecular.

Cada eu
é no fundo um nós,
mas não se dão conta, egocêntricos

e enfim o nós de tantos eus
é um mesmo nós de células e organelas.

Não me agradeça, portanto
pelo bem que faço
por tudo que dou ou deixo de roubar:

Agradeça a mitocôndria
Agradeça tia jurema
os lactobacilos vivos
as divinas bactérias carnívoras.

Eu não sou eu,
Eu somos nós

Egrégora de entidades minúsculas
coletivo de instintos autônomos.

Gentilmente, ela se move
Nossa melodia canta e dança
Sobre o altar do bem estar.

Iscado

detalhes relacionados
pequenos detalhes -

que nos compõem!

estronchos
minimais
detalhes sabores
detalhes saberes

sorvei! - oh! sorvei das mamas!

linhas de mãos
tracejam nossas vidas

pincelamos
com tintas flúor

na madrugada
Solertes
tragamos
e consagramos.

A Magia
são todas as cores
o além dos mitos e signos.

Além da caridade infértil
mil milhões de esferas além
nutrido das mais reais geléias...

Música
em espírito,

minha alma canta
a lira dos dias e noites

minha alegria dança
desabrocha a flor da presença,

roga com todos os anjos
por que possa prosperar,
em semente e fruto

por que possa prosperar
outra vez em flor...

por que possa prosperar...

Colírio D'Alma

Se você quer se emocionar
já fique logo bem sabendo:

Amor é bom
e é pra vida.

Não é só papo de maluco
que veste roupas coloridas:

O amor é grande
é de quem quiser chegar.

É bom sentir o amor chegar
de qualquer jeito que vier:

seja num pôr do sol lilás
ou num canto de pássaro na janela,

Amor é bom
e é pra vida.

Se você quer se emocionar
fique bem logo já sabendo,

que se quiser me acompanhar
é paz, amor e pé na estrada.

Paz
Amor e
Pé na estrada!...

São Nevrálio

Quando você alcança
um estágio elevado
de prazer de viver

seu coração
passar a criar implosões
perfeitas
que geram gravidade própria.

O coração
não funciona como uma válvula

mas sim como um acorde
de notas musicais

tocadas
com mais ou menos harmonia...

(pela sincronização ideal das contrações
de suas sete camadas de músculo espiralado)

- Cabe um infinito
dentro do teu peito.

Cabe mais de um infinito
dentro do teu peito
quando ele canta...

ESTÓRICO