O Caldo

Dar o melhor de mim:
Onde estaria eu agora sem o Amor?...

Gruve
Pegada
Muve
Sacada.

Odiar as paixões pra poder amá-las.
Pra poder amar o ódio passional de todo Amor.
Odiar o apaixonar-se pra poder amar-se a si.
Pra poder construir-se a si
Frio e maquinal
Pra então odiar-se fria e maquinalmente tão apaixonadamente...
Ai, pra depois apaixonar-se tão fria e maquinalmente por todo ódio apaixonado...

Vingo-me bailando.
Vingo-me sorrindo.
Vingo o sangue crístico ungindo
Coroado por um penteado luzindo -
Faço-me déspota:
Que será o melhor de mim?
Que será o invisível de mim mesmo a mim?...
Não quero errar -
Assim comprovo perfeito
Àquele tão tenaz
Ao revolto sorridente
Ao solo inconsequente
Ao meigo incompetente
Ao leigo inadimplente
Ao lépido
Ao tépido
Ao clérigo
Ao célebre.
E sigo pulsante:
Meu melhor de mim é lembrar-me do Sol.

Meu melhor de mim é lembrar-me do Sol:
Meu melhor de mim é lembrar-me que o Sol fala
A língua matre e una
Da raiz
Da fusão
Da saliva
Da razão.
Meu melhor de mim é lembrar-me do Sol e suas astúcias
As Paulas, Carolinas, as Lúcias
Quantas minúcias... ai, de minhas musas
Servas de um cego
Absortas por um fantasma
Alimentando a poção mágica de uma cornucópia demasiado humana.
Meu melhor de mim é Sol
É raiva esganiçada em um par de íris ásperas
É unidade enveredando espiralando em vórtice vertical de verdades
É simplesmente simples mentirinhas contando dos dias que tanto se contam
É júbilo gastronômico em verso
É busca por Propósito incerto
É afirmar-se Sol e mais que Sol -
Só que o Sol é tudo o que há, afinal -
E então, meu melhor de mim é mais um Sol que consome toda pedra e passado
É a gana de uma mais respiração
É a chama trêmula duma canção
O ranger heterodoxo da janela
O cingir-se marcado lenço à lapela.

E então
Mil Humanidades nascem e morrem num piscar de olhos
E um tom se esgarça esverdejando o plano
Nobre e ledo engano da ilusão da potência...
Tanta saúde funesta e intolerável circundando à Arte
E ainda assim o planeta se afoga em caçada
Inventando a parte, à parte
Se faz de espadarte
Mas não é senão juventude indomada
Insômnia compassada
Luz fragmentada...
E então
Além de minha alçada
Mais mil Humanidades nascem e morrem num piscar de olhos
E um mesmo tom esgazeia-se em deleite imoral e rejuvenesce às Entranhas do Multiverso -
Corda bamba
Sátira magna
Do magma
Em cada gingado prolongado
O leite do seio sonhado -
O aprumar-se em esfera
Postura esmera
Do voar emoção do coração
O inspirar morcego
O bufar galego
O apunhalar grego
Um desgosto um chamego.

Soturno
Improvável
O melhor de mim em mim
Um aguardar de samurai
Em sala de dentista boçal
Um trovão por cada alienação
Indigesto espírito
Inesperada degustação.

A Vida realmente parece ser um sonho infinito.
Cada entidade de cor-viva um sonho infinito pra si.
Cada interação entre duas ou mais entidades de cor-viva um sonho infinito pra si.
Cada pequenino corpo um universo todo
Em que desfrutar duma Eternidade
Se como corpo ou elemento ou ainda qualquer outro corpo.
Cada auto-contemplação auto-didata e alegre um parto infinitesimal de cor-viva através do espectro alpha e ômega que é toda central operante de consciência electronicorgânica.
Um premer de punhos e têmporas
Um acidente entre pétalas e pérolas
Casório de grilos e libélulas
Um flutuar infindo
O sem-chão do indo
Desprecavido solerte
Desmedido inerte
Salsando os intestinos
Arremessando ao alto ombros e crenças
Como tufão lilás
Sabre capataz
Abutre do incapaz
Inimigo mordaz
Antípoda do rapaz.
Meu melhor de mim o Sol que consumiu minha mesquinharia
O amargo intragável que aqui me conduziu
Pra me presentear-me a mim mesmo com eu mesmo
Doar-me a mim com desprezo
Coeso
Sensível ao toque sem peso
Faminto do mel ileso
Ímpio ao rancor obeso
Fagulha do rubror teso
Infatigável menosprezo
Esquina em que estou preso...

E então
Toda estória do cosmos percorreu o coração de Miles Davis quarenta e duas vezes em treze minutos
Sem cortes nem recortes
Um piscar de olhos devorando todos os Sóis
No vudu de uma rocha que deliza Despenhadeiro da Existência abaixo.

Nenhum comentário:

ESTÓRICO