versos inscritos em minha pele com pena de pedra
minha ambição mundana
inventei a mim um amor
parecido com a tortura da roda de despedaçamento
me agarrava abstratamente por minhas asas
e as alongava brutalmente
fazendo meu coração desabrochar como uma alcachofra cozida
pouco a pouco conquistando domínio sobre meus disléxicos titubeios
pouco a pouco me desiludindo de toda ânsia de verdade
pouco a pouco me afogando na perversidade latente
floresceu o jardim de minha vontade
e é uma visão completamente óbvia
é um jardim pacato
uma tranquilidade por vezes incomodada por sedentarismos intransigentes
é um relógio de sol inerte e estupidamente preciso
uma sagacidade morosa e relutante
é uma canção sem nome seguindo o suíngue do vento
e hoje mais que nunca prezo à força
prezo à minha gana de ter mil filhos com quarenta e duas esposas
prezo à minha família e a todo erro abissal do pensamento humano que enfim proveu meu espírito de um heroísmo palpável
eu herói de mim
não por um atestado de fama e glória
nem por uma suprema isenção fiscal
eu herói de mim por viver a bela vida que me caiba
não por provar a ninguém que o certo e o errado sejam assim ou assado
não por ser reconhecido hegemônico soberano do coração gaiano
não por satisfazer a qualquer divindade no rolar de dados do destino
eu herói de mim por falar a língua do sorrir
eu herói de mim por me permitir uma inteligência transparente
eu herói de mim por conduzir um vigor concreto e lúcido
eu herói de mim por superar meu pranto e me orgulhar de minha cria
eu herói de mim por atender à angústia da condensação de todo desejo
eu herói de mim por me satisfazer irresoluto em sufi espiral
eu herói de mim por abraçar minhas extremidades e controlar minha bestialidade
como um dia atrás do outro
como isto ou qualquer coisa completamente diversa
como qualquer coisa irrelevante que compõe uma totalidade autorreferente
como um jovem homem obscuro em sua mais alta esperança
dançar o roçar da areia da ampulheta do amor
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