Da Fome De João

Caução ao mofo
Mizifí
Atenção redigo-lhe
Areje arestas
Ventile cada esquina
Água sanitária às paredes
Deixe repousar.

Raspe a pele
Crosta suja
Arranque o ranço
Ânsia escrota
Tire este azedume de tua língua purulenta
Por céus vadios
Por todos os santos imorais
Destroça este ardido horrível de inanição
E dá tinta nova ao lar
Com todos antimofos permitidos
Passe-lhe dez demãos se aprouver
Se o orçamento eventualmente permitir.

Ai rasgado João
Na cidade pensam que o Brasil é de hoje
Pensam que nosso povo está por dentro
Mas quem viu o sertão
Quem vai e volta no ribeirão
Bem sabe do abandono
Também bem sabe dos sorrisos sutis
Superando a lamúria interminável do abandonado
Sem estradas
Sem luz nem água encanada
Cantam graças aos céus a caipirada
Já disseram
É o em torno que conta
Sem paisagem certa não há alegria.

Viciado em pessoas
Elas me afrontam
Ai quando a ofensa é morosa
O caçôo fraterno.

Consigo perdoar quem me decifre?
Mais
Consigo perdoar um mais forte que eu que me decifre?

E então que será perdão?
Condescendência pra com minha mesma fraqueza
E ainda orgulhosa condescendência
Aguardando perdões
Pra só então poupar a vingança
Ai dialeto ignóbil
Entre ursos coiotes águias e leões
Faunaflora de amizades mundanas
Plantas e fantasmas
Gutural habitual
Me recosto
Incrédulo
Fazendo risco à quebradiça bibelô
Bailarina mascarada
De porcelana frágil
Deixei-a cair
Porquê sei que não devo destruir
E por um instante destruí
E gozo do torpor triste
Destilo a ira
Fadas rasta me resgatam
Ah ruiva lilás vívida prima
Primeva Ariadne
Pisoteando vinhas em meu ventre
Encarcerando em mogno meu mel
Bebo o vinho da idade
Estou velho de súbito
Ai cabelos brancos
Ai minha vida que correu
Que correu em imaginação
E me fez agonia
Ai salvação do verbo
Me dou de novo ao novo
De presente o presente
Tenso e inútil como é
Refulgente perfeito como é.

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